quarta-feira, 17 de abril de 2013

A Psicopedagogia  em busca de sua Fundamentação Teórica
 
Enquanto campo de conhecimento humano, a Psicopedagogia tem sido influenciada por diversas correntes teóricas e, em seu histórico, sempre esteve voltada para as questões relativas à aprendizagem. Nas décadas de 50 e 60 do século passado, em seu iniciar, a visão predominante era a médica.
Nesta visão, buscava-se enfocar problemas que ocorriam com os sujeitos em relação à aprendizagem a partir de uma abordagem neuropsicológica, já que a existência de problemas de aprendizagem apresentados por tais sujeitos gerava fracassos no espaço e no tempo da escola e, para que se chegasse a sua solução, deveria investigar qual era a dificuldade, qual era o problema.
Nos anos 60 e 70, a Psicopedagogia interessou-se pelos condicionamentos, saindo da abordagem focada apenas nas possíveis falhas e avaliando os desempenhos dos sujeitos em situação de aprendizagem numa perspectiva behaviorista.
Considerando os porquês das dificuldades e dos problemas de aprendizagem nos sujeitos, os estudos psicopedagógicos da década de oitenta mudam o enfoque e passam a ser consideradas as diferentes influências do meio social e cultural, abandonando a perspectiva de somente observar como estas dificuldades e problemas se manifestam.
 A visão que surge, então, é considerada como sendo uma visão social, levando em conta a relevância das influências do meio sócio-cultural para a aprendizagem. As idéias de Lev S.Vygotsky ganham espaço e fundamentam novas perspectivas para se compreender as dinâmicas presentes nos processos de aprendizagem, construindo um perfil profissional psicopedagógico baseado na interdisciplinaridade como metodologia e proposta de adoção de estratégias de intervenção e pesquisa.
É um momento bastante fecundo, onde novas teorizações e aportes significativos surgem como elementos fomentadores da práxis psicopedagógica que, a partir de então, ganha novas perspectivas de ação e novos espaços para sua inserção. Na década de 90, com os avanços em outros campos do saber humano, principalmente das Neurociências, da Biologia, da Sociologia e da Psicolingüística, entre outras revisões epistemológicas, a Psicopedagogia insere-se, definitivamente, como um a área de atuação e um campo do saber humano interdisciplinar.
Com isso, a Psicopedagogia avançou no sentido de objetivar, cada vez mais, o sujeito na construção de sua autonomia, vinculando o eu cognoscente as suas relações com a aprendizagem. Processos de investigação sobre a construção, integração e expansão deste sujeito aprendente se tornam cada vez mais presentes na pesquisa psicopedagógica e é muito rica a produção que podemos notar neste período.
O processo de aprendizagem passa a ser tema essencial para se compreender a construção do sujeito cognoscente, meta maior a ser alcançada para que ele se torne capaz de ser o próprio responsável pela construção do conhecimento.
 
   O Ser e o saber na construção do sujeito cognoscente
 
Numa perspectiva tradicional, sabemos que a aprendizagem tem sido compreendida como pista de mão única, onde o professor possui a tarefa de repassar o saber para o aluno, percebido como um ser que precisa receber este saber, sem que nenhum outro processo seja válido.  Desconsiderando as relações sociais, nesta visão do processo de aprendizagem, somente o professor detém o saber e entre alunos e professores nenhuma outra espécie de vínculo pode haver a não ser esta: o professor sabe e o aluno não sabe, portanto, a tarefa educativa deve ser a de repassar o que o professor sabe para o aluno, que, supostamente, nada sabe e só vai aprender se receber o saber.
Na atualidade, muitos são os movimentos pedagógicos para mudar definitivamente este modo de fazer educação, visto que existem diversos trabalhos e diferentes práticas que propõem mudanças de olhar e percepção sobre a aprendizagem, redefinindo os agentes de todo o processo e seus respectivos papéis.
Da pista de mão única à de mão dupla: uma boa metáfora para pensarmos sobre o par conceitual ensinantes e aprendentes, em processos de aprendências e ensinagens.  Em muitos momentos, é preciso criar novos campos semânticos para mudarmos nossas percepções e nossos paradigmas: a construção de novas idéias remete-nos a necessidade de buscarmos novas expressões, para significar novas possibilidades, e como isso, trazer mudanças ao nosso pensar.
No caso especifico do par conceitual aqui colocado, o que considero essencial é relacionar aprendentes e ensinantes como caminhantes, numa mesma direção. A poética que tal modificação induz ao nosso pensar é que, aos estarmos juntos nos processos de aprender e ensinar, de lidar com informações, conhecimentos e saberes, é possível elaborarmos em parceria vínculos como passaporte para a aprendizagem.
Em "A inteligência aprisionada” , Alicia Fernández trabalha esta importante questão, quando elabora idéias para refletirmos sobre uma concepção de processo da aprendizagem onde o aprendente é considerado como um sujeito pensante, portador de sua inteligência e onde ao ensinante, através dos vínculos que conseguem firmar, é portador do conhecimento: nesta relação, aprendentes e ensinantes estabelecem uma relação entre fatores que, quando colocados em jogo, facilitam processos de aprendências, com gosto de denominar.
E que fatores são estes? Pelo que aprendi com Alicia é o organismo individual que o aprendente herdou, o seu corpo, construído de modo especular, e a sua inteligência, que é auto-construída nas interações e na arquitetura do desejo, que sempre é o desejo de outro.
Assim, é essencial o vínculo que se estabelece entre ensinantes e aprendentes, para compreendermos o como aprendemos. Sara Paín, referencial também importante para nossos estudos em Psicopedagogia, nos convoca a pensar que a aprendizagem é um importante processo que nos permite vivenciar a transmissão do conhecimento de um outro que sabe, para um aprendente que vai tornar-se sujeito e desenvolver sua subjetividade pelo fato de estar em processo de aprendizagem. 
Tal processo, entretanto, só acontece de modo qualitativo quando o ensinante consegue utilizar as instâncias do orgânico, do corpo, do intelecto e do desejo, integrando ao saber de cada aprendente conhecimentos aprendidos e que podem ser utilizados de modo significativo, transformando assim, o ensino em conhecimento.
Aprendentes, como sujeitos da aprendizagem, possuem saberes que os sustentam e tais saberes são frutos de seus próprios movimentos e buscas por novas aprendizagens e novos conhecimentos. É na articulação do organismo, do corpo, do desejo e da inteligência que o aprendente, como sujeito, se constitui. No movimento que faz ao interagir com a família e a escola, com as instituições, com os outros, enfim, o aprendente constrói a sua modalidade de aprendizagem, de modo constante e permanente.
Assim, o ser e o saber na construção do sujeito cognoscente, do sujeito aprendente, é tema essencial para buscarmos aprofundamentos teóricos e reflexivos, que nos conduzam a pensar nas complexas dinâmicas presentes no ato humano de ensinar e aprender.
 
   As complexas dinâmicas no ato humano de ensinar e aprender: idéias, processos e movimentos para pensar em Aprendizagem.
 
Diante dos  referenciais admitidos pode-se perceber que a aprendizagem é um processo onde o organismo, o corpo, a inteligência e o desejo articulam-se em busca de determinado equilíbrio. Entretanto, a estrutura intelectual, de acordo com Jean Piaget precisa de equilíbrio para estruturar o conhecimento do real e, assim, sistematizá-lo por meios dos movimentos de assimilação e acomodação
Com o estudo deste importante autor, aprendemos que assimilação pode ser compreendida como movimentos dos processos de adaptação, através dos quais os elementos presentes no ambiente são alterados, com o intuito de serem incorporados à estrutura do organismo.
Já por acomodação, conforme aprendemos em Piaget, entendemos como sendo os movimentos que elaboram os processos de adaptação que alteram o organismo, em concordância com as características do objeto com o qual se relaciona.    
Assim, o organismo é sustentado e evolui através das relações que consegue estabelecer com o ambiente onde se insere e, deste modo ele se adapta, utilizando-se dos movimentos de assimilação e acomodação.
De acordo com Alicia Fernández, são estes movimentos de adaptação que configuram a arquitetura onde a atribuição simbólica de significações próprias, que o sujeito aprendente faz, em relação aos processos de aprendizagem onde interage.Entretanto, para que todo este processo favoreça adaptações inteligentes, é necessário que os movimentos de acomodação e assimilação estejam em equilíbrio, ou seja, um não pode predominar em excesso sobre o outro. Com os estudos de Sara Paín é possível observar os processos de hipoassimilação /hiperacomodação, e de hipoacomodação/hiperassimilação, que constituem as diferentes modalidades presentes nos processos representativos que afetam a formação deste equilíbrio. 
Tais modalidades interferem tanto nas reações e respostas que o organismo produz em sua interação com o meio, quanto nos processos de aprendizagem, que se pressupõe normal quando esta é produzida numa relação onde os movimentos assimilativos e acomodativos apresentem-se em equilíbrio.
São as elaborações objetivantes e subjetivantes que farão com que o sujeito aprendente e desejante, de fato, aprenda, pois aprender é apropriar-se, e tal apropriação permite que o objeto do conhecimento, da aprendizagem, seja ordenando e classificado. No aspecto subjetivo, tal movimento irá gerar o reconhecimento e a apropriação do objeto, como resultado das vivências e das experiências que o aprendente obteve com sua relação e interação com este objeto. Vale a pena relembrar que todo este processo ocorre na articulação das instâncias do organismo, do corpo, da inteligência e do desejo que constituem o mover-se do sujeito aprendente, além dos vínculos que consegue estabelecer com os outros aprendentes e com os seus ensinantes.
Todas estas idéias favorecem o nosso pensar, agir e refletir para as questões relativas à aprendizagem em nosso tempo. Se o aprendente se faz sujeito desejante de modo gradativo, a construção do seu saber deve ser investigada e analisada. Cabe a todo ensinante ser ponto de referência, suporte colaborativo e atencioso, observando expectativas e necessidades e valorizando, cada vez mais, as construções e descobertas de seus aprendentes. 

Sugestão Bibliográfica:  


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